Parque do Varvito (Itu, são paulo,brasil)
Varvitos: um registro geológico ano a ano
Pércio de Moraes Branco
Os processos geológicos costumam ser lentos, ocorrendo ao longo de séculos, quando não milhares ou milhões de anos. Enquadram-se nessa regra a deposição de sedimentos (cascalho, areia, argila etc.), trazidos pela água ou pelo vento, que vão se acumulando e com o passar do tempo sofrem compactação, dando origem a uma rocha sedimentar. Desse modo, quando se observa um pedaço de rocha sedimentar de alguns centímetros normalmente se está observando o resultado de um longo período de deposição de material sedimentar.Há uma rocha, porém, que é uma notável e muito interessante exceção a essa regra: o varvito. Os lagos são muito comuns nas regiões glaciais e podem se formar em diversas situações. Uma delas é o degelo das porções laterais ou frontal da geleira.
Chama-se de varvito uma rocha sedimentar formada pelo acúmulo de sedimentos depositados num lago próximo a uma geleira. No verão, o degelo libera água e, com isso, sedimentos como areia ou silte são carregados para o lago, formando lâminas ou camadas de cor cinza-clara. No inverno, a superfície do lago congela e cessa o aporte de sedimentos. Aí o que ocorre é apenas a decantação da água sob o gelo, com a deposição da argila ou do silte que estava em suspensão, formando camadas ou lâminas cinza-escuras. Quando volta o verão, surge novamente o fluxo de água e torna a aumentar o diâmetro dos grãos depositados.
Essa deposição com ritmo bem definido permite que rochas desse tipo sejam também chamadas de ritmitos.
O silte – material com grãos maiores que os da argila, mas menores que os da areia – pode aparecer tanto nas lâminas claras quanto nas escuras.
Foto Varvito de Trombudo Central(SC) |
Cada conjunto desses RECEBE o nome de varve (daí chamar-se a rocha de varvito) e corresponde à deposição de sedimentos ocorrida em um ano.
Vê-se, portanto, que uma amostra de varvito de alguns centímetros de comprimento define um número mensurável de anos de deposição de sedimento, permitindo ver o trabalho da natureza ano a ano.
Um intervalo claro mais espesso que os demais indica a ocorrência de um verão mais quente ou mais prolongado. Um intervalo espesso escuro mostra que o inverno é que foi mais prolongado.
Clastos caídos
No processo de degelo, as geleiras podem liberar fragmentos de rocha bem maiores, como seixos, blocos e matacões. Nesse caso, eles cairão sobre o material mais fino já depositado no fundo do lago e romperão ou deformarão a sequência de laminas depositadas. Esse material mais grosseiro recebe o nome de clastos caídos (também chamados frequente, mas erroneamente, de clastos pingados ou seixos pingados) e é um dos fortes indícios de que se está diante de uma rocha sedimentar de origem glacial.
Icnofósseis
Outra feição típica dos varvitos, bem mais comum que os seixos pingados, são icnofósseis constituídos de rastros deixados por animais invertebrados que se deslocam no fundo do lago. Eles abrem pequenos sulcos no material ainda inconsolidado, que podem ficar preservados quando da compactação dos sedimentos.
Os animais que deixaram esses vestígios, porém, raramente são encontrados fossilizados nos varvitos, provavelmente porque são frágeis demais para que ocorra sua preservação.
A foto abaixo mostra esses rastros sinuosos em varvito de Trombudo Central (SC). Além deles, podem ser vistas também claras deformações causadas por clastos caídos.
|
Varvitos no Brasil
No Brasil, são famosos os varvitos de Itu (SP), onde foi criado, em 23 de julho de 1995, o Parque do Varvito. As fotos abaixo mostram afloramentos dessa rocha naquele parque, podendo-se ver a grande regularidade da estratificação.
Varvitos eram extraídos em Itu desde o começo do século XVIII pelo menos. Quando a pedreira foi desativada parte dela foi tombada pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Artístico, Arqueológico e Turístico do Estado de São Paulo e transformada em parque.
Parque do Varvito em Itu (SP) - (Fotos: Wikipédia) |
Acima, à esquerda, varvito de Itu com clasto caído. À direita, o mesmo varvito (Campos & Santos) |
Em Itu, varves situadas na porção superior são mais delgadas que as inferiores e mais antigas. Isso é interpretado como sintoma de que a geleira estava se afastando do lago, dessa forma o volume de sedimentos que a ele chegava foi ficando menor a cada ano.
Itu pretende que a Unesco reconheça o Parque do Varvito como patrimônioo geológico da humanidade.
Outra ocorrência muito interessante de varvito está em Trombudo Central (SC). Nesse município, a rocha é aproveitada comercialmente, na forma de lajotas para calçadas (vendida com a denominação equivocada de ardósia), e exportada em peças maiores para tampo de mesas de bilhar, dada sua superfície absolutamente plana. O varvito catarinense é também usado em móveis rústicos e beneficiados, sendo exportado para vários países, sobretudo a Argentina (ver vídeo em http://www.youtube.com/watch?v=IdmqWqr-Dco).
Para extração das lajotas, uma máquina com um disco diamantado vertical é empurrrada por sobre as lajes e à medida que vai se deslocando vai cortando a rocha em quadrados ou retângulos. Depois, introduz-se horizontalmente uma pequena cunha que descola as lajotas com facilidade.
Os varvitos de São Paulo e de Santa Catarina pertencem ao Grupo Itararé, da Bacia do Paraná, e mostram que ali houve uma grande glaciação do Carbonífero Inferior até o Permiano Inferior, entre 360 e 270 milhões de anos atrás. Naquele intervalo de tempo, toda a porção sul do supercontinente Gondwana ficou coberta por espessas camadas de gelo.
Fontes
O Parque dos Varvitos. Wikipédia. http://pt.wikipedia.org/wiki/Parque_do_Varvito, acessado em 2 de julho de 2013.
ROCHA-CAMPOS, A. C. & SANTOS, P. R. Ação geológica do gelo. IN: TEIXEIRA, W. et al. Decifrando a Terra. São Paulo, Oficina de Textos, 2000. 568p. Il. p. 215-246. il.